Isabelle pensava no universo enquanto retirava as roupas do varal. Enquanto guardava sutiãs e calcinhas imaginava (como bióloga que era) que a natureza nunca fez nada que não fosse objetivo, prático e funcional. O que se tornava obsoleto, a evolução devorava. Foi assim com parte de corpos e até com espécies inteiras. As indagações de Jonas a levaram a refletir sobre isso. Ele era um pensador. Realmente não é necessário algum diploma para entrar em contato com a Criação.
O rapaz desenhava as plantas do jardim como se ilustrasse um antigo livro de botânica. Era o seu hobby. Jonas era escritor, formado em jornalismo e estudante do que chamava de "tudo". Enquanto agachava desajeitado, com a prancheta em mãos e os olhares atentos, provocava a noiva. - Por que pensamos? Por que nos perguntamos quem somos e de onde viemos? Que traços evolutivos são esses que nos levam a perceber detalhes muito além dos meramente físicos? - Isabelle ouvia em silencio e com atenção. Com seu noivo era mais fácil pensar nessas coisas.
Para Isabelle, Jonas estava certo. Ele havia encontrado o mistério que anos de laboratório não revelam. A capacidade de amar o conhecimento, a faculdade de filosofar não só não foi eliminada pela mãe de todas as coisas,como foi aperfeiçoado no correr das eras. Uma joaninha tem pintinhas pretas, um pássaro, plumas amarelas, um lagarto, língua comprida, um homem, imaginação. - É verdade Jonas. Damos significados a tudo. Se não o fazemos conscientemente, o fazemos inconscientes. É a nossa natureza.
Jonas terminou de detalhar um tomate e sentou-se sobre folhas secas deixando a prancheta de lado. Isabelle terminou de recolher as roupas e as guardou numa bacia em cima de uma mureta que dava passagem ao quintal. Uma aranha caranguejeira atravessou furtivamente o chão da área de serviço. Ele levantou uma pedra e miríades de insetos deslizaram sobre o chão para todos os lados. Ela passou a mão sobre a barriga que amadurecia um filhote ainda celular, que seria num dado momento uma menina.
O homem concentrou-se num tatu-bola que parece não ter percebido o apocalipse de seu universo. Isabelle soltou Kali, a labrador caramelo da casa, e a cadela correu feliz pelo jardim,fazendo o ragnarok das aves e de outros pequenos animais que visitavam o estabelecimento. A aranha entrou debaixo da máquina de lavar roupas. As nuvens encobriram o céu e uma réstia de sol feneceu sobre os traços no papel. - Vai chover querido. Vamos para dentro. - ela disse virando as costas. Ele enfiou o lápis no bolso da bermuda e a seguiu.
Isabelle entrou sorrindo, pensando em qual seria o seu propósito no universo. Jonas entrou pensando em qual seria a relação entre a forma do tatu-bolinha e dos planetas que vagueiam pelo espaço. Kali latiu e passou correndo pelo casal, entrando na casa. A chuva apressou suas gotas e engrossou seu caldo. Eles pregaram o desenho junto com os outros na parede da sala, um mural artístico quase infantil, e foram fazer os trabalhos que tinham levado para casa. O tema da próxima semana seria gestação.
segunda-feira, 14 de abril de 2008
Cosmogonia de fundo de quintal
Marcadores:
Narrativas
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gestação é o q bem define nossa conversa de ontem...
ResponderEliminarbjocas!
O pó de lá, mudou-se para cá.
ResponderEliminarFoi bem rápido.
Nem notamos como aconteceu.
Então, o Sr. Enfim chega de mansinho.
Dizendo tchau no seu ouvido.
Vai longe. Avôa pra lonjão.
Só não esquece do maracujá.
B, b.
liberei os comentários...divirta-se!
ResponderEliminar;)
e eis que ele inventa de comentar em todo texto. Perae, deu preguiça nos cinco finais?
ResponderEliminarE só pra constar: nao foi ali que eu caí, mas bem que poderia ter sido... hahaha
B, b.